segunda-feira, abril 05, 2004

Gratuitidade em Larry Clark

Infelizmente ainda não me foi possível ver o Bully. Apenas li algumas críticas, o que é óbvio que não é nunca suficiente para falar do filme.

Quanto ao Kids, considero que Clark atingiu, em relação aos filmes que vi dele, o seu auge logo ao primeiro filme. Talvez devido ao argumento de Harmony Korine, que é absolutamente fantástico. O Another Day in Paradise é absolutamente dispensável, tanto quanto os restantes - repito, que já vi - são indispensáveis.

Em Ken Park, Clark filma sem guião absolutamente definido, apenas tem um programa de filme, filma os sentimentos - ou a ausência deles - das personagens. Filma a ternura, como tu disseste muito bem Jorge. Mas filma também a frustração e o "gap" entre o mundo adulto e o mundo adolescente. Não há explicação para o sexo porque não é necessária a explicação. O sexo existe apenas porque sim, porque é bom. Por isso a cena final é a três e não apenas a dois, porque é bom e há necessidade de o compartilhar.

Em Kids há um guião a definir a acção e, por muito que Korine afirme que Clark subverteu o seu argumento, nota-se que o filme segue uma regra pré-estabelecida, sendo a acção delimitada por um espaço bem definido, embora muito pouco rígido em si mesmo.

Neste contexto, o Another Day in Paradise apenas serve para afirmar a aparente dificuldade de Clark em se mover com o espartilho de um argumento do tipo tradicional. O filme vê-se muito preso à história que, além disso, foge à temática dos restantes filmes - ou mesmo fotografias - de Clark. Talvez por isso Ken Park seja um objecto muito livre, muito solto, entregue ao amadorismo dos seus jovens actores e à iniciativa do elenco dito "adulto" que se vê sem grandes amarras talvez pela primeira vez na carreira.

Clark filma corpos em plena exaltação da adolescência, é esse o conteúdo programático da obra de Clark. E se o fizer pelo lado dos seus vícios tanto melhor. E isso não é pornográfico por ser explícito, é não-pornográfico por ser apenas demonstrativo.