quinta-feira, novembro 25, 2004

estamos calmos a ver o que vai aparecendo

Como sempre.

quarta-feira, novembro 17, 2004

Um Fim?

É possível, pelo menos para mim. O Série B, tal como foi explicado nos seus primórdios, foi criado pra fazer reviver parcialmente o programa de rádio que lhe deu origem. Hoje, uns meses mais tarde, o formato começa a cansar-me.

Dá-me prazer falar de cinema, mas sempre num formato de discussão. O problema está no facto de os blogues portugueses de cinema parecerem gostar, essencialmente, de mandar bitaites sobre os filmes de que falam. Não é uma crítica negativa e a ninguém em particular, cada um escreve como gosta. Só que todos gostam de ser lidos. E isso não se passa assim tanto com o Série B, especialmente com os meus posts de críticas aos filmes. Talvez sejam demasiado extensos ou talvez não apresentem o famoso sistema de classificações. Seja como for, o processo vai cansando.

Por isso mesmo decidi, pelo menos durante uns tempos, suspender a minha actividade no Série B. Espero que o João e o Jorge o continuem, pela minha parte continuarei com uns posts de cinema no meu blogue pessoal e talvez vá deixando aqui um ou outro apontamento. Até um eventual regresso.

Saudações Cinéfilas

quinta-feira, novembro 04, 2004

BD em cinema?

Nos últimos anos tmeos visto inúmeras adaptações para o cinema vindas da BD. Isto tem sido particularmente verdade no que respeita aos super-heróis, desde o Super-Homem de Christopher Reeve ao recentíssimo Justiceiro (The Punisher no original), passando pela obra-prima absoluta que é esse opus a dois tempos de Tim Burton: Batman/Batman Regressa.

O que raramente temos visto são adaptações de BD que sigam o espírito original, uma ideia de caos alegremente pintado e de uma fantasia saudavelmente ignorada. Vimos isso numa obra menor mas nem por isso merecedora de menorização, de Warren Beatty: Dick Tracy. Já este ano encontrámos Hellboy, com potencialidades para tanto mas nas mãos de um realizador demasiado "dark" para o tornar, digamos... "giríssimo".

Vem-nos agora parar às mãos um filme sobre um herói que não saiu de nenhuma banda dsenhada, mas de várias: Sky Captain. Sky Captain and the World of Tomorrow parece ter saído de um episódio do Major Alvega (o da televisão, meus amigos, o da televisão) que por milagre do destino multiplicou por um milhão o seu orçamento.

O programa é simples, tal como na BD: um vilão, sugestivamente chamado Totenkopf, está a raptar as mentes mais brilhantes do mundo. Ao mesmo tempo sucedem-se os ataques de robôs gigantes a cidades e outros locais que alberguem poderosas fontes de energia. Incapazes de responder ao perigo, os governos do mundo - que é o mesmo que dizer os Estados Unidos da América - pedem a Sky Captain e sua equipe que os salve.

É simples e simplista, tal como qualquer bada desenhada deve ser. Tem um herói jovem e atraente (Jude Law), uma heroína metediça, bonita e marcadamente feminina (Gwyneth Paltrow num registo muito Lois Lane) e ainda uma outra heroína forte e determinada capaz de comandar o respeito dos homens (Angelina Jolie). Tal como todas as BD's, a acção segue para outras paragens e chegamos a passar pelos Himalaias. No fim, como não poderia deixar de ser, vemos uma ilha, forçosamente não cartografada, que transpira de irrealidade.

Para não deixar spoilers é melhor ficar por aqui no que diz respeito à história. Quanto ao resto, pode-se ver o prazer que o realizador retirou do filme. Começou por ser um projecto pessoal de Kerry Conran que, depois de este ter preparado um teaser, se converteu num filme de milhões de dólares e com elenco de luxo. A acção foi filmada com recurso ao digital, mas sem entrar em falsos realismos. Toda a atmosfera do filme é artificial, como se tivesse acabado de sair da prancha de um desenhador que gosta de carregar na cor (semelhança evidente com Dick Tracy, embora um pouco por outro caminho). O suposto período histórico, situado algures nos anos 30, ajuda ao cenário retro domina as imagens (Batman em todo o seu esplendor). O melting-pot de influências, desde ideias devedoras do expressionismo alemão, passando pela Guerra dos Mundos de Wells ou Welles, o edifício do jornal de Paltrow a evocar o de Clark Kent e Lois Lane, a jornalista decidida e superficialmente invulnerável a lembrar a Barbara Stanwyck de Meet John Doe, diversos monstros a evocar os filmes de série b dos anos 50, etc. Conran mostra que sabe muito bem em que espaço se movienta e aquilo que quer para o seu filme. Notável também o aproveitamento de Sir Laurence Olivier para uma "aparição" além-túmulo.

O filme é um prodígio de realização? Nem por isso. Tem interpretações deslumbrantes? Não, nem as personagens têm espaço para tanto. A história é inovadora? Além da abordagem técnica que recebe, estaremos muito longe disso. O que é que torna então este filme diferente? Talvez a possibilidade, a primeira desde há muito tempo, de olhar para um filme com o fascínio infantil da sua origem e confirmar que ainda há alguns caminhos a desbravar, mesmo na área do entretenimento.

PS - tentei estragar o menos possível a surpresa. Depois verão. Também vale a pena descobrir a surpresa final.

Template

Deixo aqui uma pergunta aos nossos leitores (sim, a ambos!):

Com a nova oferta de templates que o blogger dá, que acham de fazer uma mudança no visual do Série B?

PS - Jorge, João, isto também é para vocês, afinal de contas ainda não responderam ao meu mail.

A Queda

Este fim de semana deverei ir ver o Der Untergang, sobre os últimos dias de Adolf Hitler. Já provocou celeuma q.b. na Alemanha e promete ser memorável. Algum aviso de última hora para não o ver?

Fez-se um filme em Portugal. E ainda bem.

Obrigado Jorge pelo post que colocaste abaixo. Realmente fazem falta estas chamadas de atenção. O cinema não é só anglo-saxónico nem o cinema português apenas Oliveira e César Monteiro. É preciso que alguem nos recorde disso.

quarta-feira, novembro 03, 2004

Fez-se um filme em Portugal

(artigo também em acabra.net)

Há duas maneiras úteis de olhar para o novo filme de João Canijo: enquadrando-o ou na obra do realizador ou no panorama global do cinema português.

João Canijo sempre foi um marginal especial numa cinematografia particularmente interessada em não repensar o conceito de autor. Escolhendo mostrar as personagens e histórias que toda a gente vê, mas de quem ninguém fala, conseguiu criar uma obra em que Portugal é retratado através dos aspectos mais resquiciais da sua personalidade enquanto país. Canijo filma o pimba, a pobreza, o sujo, o feio, em suma, o iníquo, e não tem pejo em mostrá-lo. Linhas constantes na sua obra são as relações familiares, o sexo, um certo asco quanto à dimensão física do humano e a morte. Simultaneamente, Canijo consegue basear o seu tratamento destes temas tanto em modelos clássicos do cinema (o road-movie, o western) como em géneros populares portugueses. Com “Noite Escura”, Canijo consegue concentrar tudo aquilo que sempre tem feito, ou seja, Canijo entendeu-se consigo próprio e chegou à melhor maneira de ser Canijo: filmou a história de uma noite numa casa de alterne, indo buscar elementos tanto à tragédia grega (“Noite Escura” é inspirada em “Ifigénia em Aulis”, de Eurípides) como às histórias de faca e alguidar. Para além do mais, o realizador é dos que em Portugal melhor uso faz da cor enquanto recurso expressivo e isso é particularmente importante quando se fala de um modo que prima por escapar ao naturalismo. Do ponto de vista técnico, “Noite Escura” é inatacável, o que é de louvar num país onde tantas vezes se chega ao fim da rodagem sem dinheiro suficiente para o som.

É por aqui que “Noite Escura” consegue fazer a sua marca na história do cinema português. É um filme denso, mas filmado com um elenco reduzido e com um número limitado de décors. A câmara de Mário Castanheira é simplesmente fabulosa, sabendo usar com mestria os sempre arriscados primeiros-planos e os planos-sequência, de um modo suspenso que traduz excepcionalmente o flutuar lúbrico e a erosão de valores e conjugado com uma montagem fluidíssima de João Braz e Jackie Bastide. “Noite Escura” é precisamente isso, ou seja, um filme fundamentalmente moral, que não é o mesmo que moralista. É ainda um filme cujo argumento foi fruto de uma pesquisa que se prolongou durante dois anos, o que se nota, e tem fabulosas interpretações - Canijo filma com actores que conhece e com os quais se entende bem, e é injusto realçar apenas Beatriz Batarda. Em suma, “Noite Escura” é brilhante, tanto na parte técnica, dimensão em que o cinema português claramente tem progredido, como na parte artística, a grande armadilha, sempre tão propensos que somos a deixar-nos embalar pela toada pseudopoética de um monólogo para nós e mais ninguém. Canijo encabeça, como seu mais experiente representante, uma nova maneira do cinema em Portugal, livre do cânone da Escola Superior de Cinema, sendo que estará acompanhado nessa renovação criativa por António Ferreira e pouco mais (já que o corte que Ivo Ferreira anunciou foi mais um fogacho do que outra coisa).

“Noite Escura” foi filmado no limitado e pequeno meio português, surpreeende pelo seu equilíbrio interno e, como não fica de boca aberta e língua pendurada a a autocontemplar-se, é um portento de cinema. Quem dera que mais filmes pudessem dizer o mesmo.